sábado

O monge


Manhã cedo, o Sr. A. e o Sr. B. subiam a travessa de C., quando, coisa nunca vista por ali, na sua direcção, mas a descer, progredia um monge. O homem, por aquelas bandas, só podia estar perdido.
Ávido, pleno daquilo a que se chamaria, autrefois, 'uma concepção agónica da vida'. O Sr. B. dirigiu-se-lhe e esbofeteou-o. Depois, como se arrependido, rojou-se pelo chão suplicando lhe batesse o monge por sua vez, assim o redimindo de tanto pecado. Como o monge recusasse, o Sr. B. pregou-lhe novo par de estalos e a cena renovou-se com o Sr. B., já soluçante, implorando a coça merecida. De novo o monge permanecia na recusa e de novo se repetia o lance e o carpido. O Sr. A., boquiaberto, assistia.
A certa altura, a cera estourando-se-lhe, o monge dispara ao estalo e ao murro, deixando o Sr. B. prostrado, o queixo por terra.
O Sr. B. ainda faz um gesto de reconhecimento. Mas o monge declina. Que não tinha sido nada. Que lhe concedia a expiação, como a concedera a si próprio em oração. E continua a descer a calçada, um pouco distraído, seguramente em melhores cores.
O Sr. B. sorria, mesmo se por terra, quando o Sr. A., readquirindo o dom da mobilidade, dele se aproximou. Era um sorriso de anjo, certamente, mas um sorriso incerto, onde um amargo de boca luzia em meio ao contentamento.

Naquele instante, dois ucranianos que desciam a travessa deitaram-lhe os olhos, depois prosseguiram rumo à rampinha, demasiado apressados.
Satisfeitos, apanharam os olhos. O Sr. B. guardou-os como recordação.

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