pequenas histórias de um pequeno símio que nasceu sem querer e que sem que também o queira irá um dia morrer
sábado
Morte súbita
Um dia um tipo acorda e quer dar uma foda. Vê a vizinha e quer dar uma foda. No trabalho olha as estagiárias e quer dar uma foda. Uma doente diz-lhe que quer dar uma foda, mas ele sabe que foi um devaneio súbito e preenche tranquilamente os papéis. À noite quer dar uma foda, a mulher dorme e ele quer dar uma foda. Ele que nunca liga o bicho, cede agora ao bafo radiante da televisão e engole o xanax com a bebida. A mulher está de enxaqueca nocturna há anos e o tipo prepara a terceira bebida enquanto despe o roupão e põe o casaco e pega nas chaves.
Os faróis do carro mostram mulheres que dão fodas. Abre a porta. Nem tem de voltar a olhar para ela. Uma foda solitária é ainda assim uma foda. Fecha os olhos. Quer cavalgar uma foda, não a quer ver. Há uma macieza na pele inesperada, sente-a.
Quando abre os olhos vê um rosto exangue doer-se, uns olhos como gelo voltarem-se-lhe, depois um tremor e um frio que o arrepiam. Larga-a sobressaltado só para a ver tombar. O corpo de uma mulher nos seus quarenta jazia ali, a seu lado, exibindo uma pele crua e desconhecida e uma bolsinha preta de lantejoulas de usar ao ombro trilhada sob as pernas metidas em meias de nylon descidas pelo joelho. A saia, muito curta, levantava pelas costas.
Ainda lhe pegou o pulso. Não havia nada a fazer. Abriu a porta e empurrou o corpo que rolou para a valeta. Subiu as calças. Ficou algum tempo imóvel, depois ligou os faróis.
No dia seguinte não comprou o jornal.
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vida é foda e se não foder tifodem mesmo ou então fosga-se um home num é de bronze
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