domingo

Com sapatos o mundo era destituído de erro


A charrete, o equino destituído de serventia, a mulher e os seis filhos, a alma, o trabalho, tudo ficava rapidamente para trás. O Sr. A., de pijama old fashion às riscas verticais azul claro, azul mais claro e branco parecia feito de pasta de dentes.
Quando o cavalete abrandou o passo num campo de trevo, as meias vermelhas sobressaíram, felpudas, em lã grossa e albergueira, no verde do prado. Nessa altura, apercebendo-se de que estava de meias, o Sr. A. revirou-se e lançou a montaria na direcção de que proviera. Ao invertido galope da besta avistava já o trabalho, a alma, depois os seis filhos por ordem crescente e, finalmente, a mulher, o cavalo inutilizado e a charrete.
O cavalete estancava agora no justo ponto de que partira. O Sr. A. subiu a charrete, calçou e apertou os sapatos castanhos e desceu.
De sapatos sobre as meias vermelhas, o Sr. A. sentiu que o mundo voltara ao normal, beijou a mulher e cada um dos seis filhos e picou o cavalete que largou num galope desabrido.

Com sapatos o mundo era destituído de erro.

Sem comentários:

Enviar um comentário